O corpo da mulher não é público ou pelo menos não deveria ser
Antes de começar a leitura pare por um minuto e reflita sobre a quantidade de casos de estupro que você tomou conhecimento essa semana, pense não apenas os noticiados na imprensa, mas também aqueles que a mídia não noticia, relatados por parentes, amigos, vizinhos entre outros. Surpreendente né?
Segundo a ouvidoria nacional, em 2022 mais de 8 mil denúncias de crimes sexuais foram registradas, a maioria com casos recorrentes por mais de ano. O que chama a atenção é que a maior parte dos estupros denunciados são cometidos contra crianças de até 13 (treze) anos de idade.
Esses são alguns dos reflexos de uma sociedade antiga e machista que atravessa o tempo até a nossa atualidade e espelha um comportamento sexual extremamente violento. A cultura do estupro e da violência contra a mulher, impede que a sociedade evolua da maneira que deveria, criando jovens sob uma cultura preconceituosa, machista que tenta justificar comportamentos agressivos através de uma inversão de valores e de um falso moralismo.
O jeito que uma mulher se veste, se comunica ou se comporta, não deveria ser um julgamento que a condene a ser vítima de um estupro! A violência não tem justificativa! Até porque a culpa de quem comete um crime sexual em hipótese nenhuma deveria ser atribuída à vítima.
A culpa não deve ser transferida para a mulher. Até mesmo nas consequências, como por exemplo a interrupção de uma gestação proveniente de um estupro, a mulher é novamente julgada (Vai abortar? Vai entregar o filho para adoção? 50% da genética é sua, não tem Deus no coração?).
Por que não violá-la de todas as formas possíveis e imagináveis? Afinal a responsabilidade é dela, ela que procurou passar por essa situação.
As mulheres estupradas em meio a essa cultura opressiva, apesar de vítima, em sua maioria desenvolvem um sentimento de culpa e vergonha, como se fossem culpadas ou detivessem algum tipo de controle sobre essa situação. Vivemos em uma sociedade na qual as mulheres têm medo de sair de casa, ou mesmo utilizar o transporte público.
Tudo isso geram os milhares de estupros não notificados às autoridades, por uma falta de acolhimento ou descredibilidade na hora de fazer o boletim de ocorrência, vergonha ou medo, entre outros fatores. De acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), publicado no início deste ano, a cada 10 minutos uma mulher é estuprada no Brasil e desses casos apenas 35% são notificados às autoridades e menor ainda é o número dos que viram ação penal na Justiça sendo apenas 6%.
E mesmo com esse baixo índice de denúncias, o FBSP mostrou que em 2021 foram contabilizados 49.497 casos na polícia e o Sistema Único de Saúde (SUS) registrou 22.918 casos. Pesquisadores do Atlas da Violência apontam que os números reais de casos sejam em torno de 300 a 500 mil.
A mulher desde criança é ensinada que não pode confiar em ninguém; nas escolas são ensinadas canções de partes do corpo onde outras pessoas não podem tocar, nem mesmo os homens da família que deviam estar ali para acolher e amar, como o pai, irmão, tio. Além dos que estão no ciclo de convivência como professores, médicos, colegas de trabalho, entre vários outros.
Segundo o FBSP, a maioria das vítimas,foram estupradas por alguém do convívio com quem mantém algum vínculo, 40% dos casos são cometidos por pais ou padrastos, 37% por primos, irmãos ou tios e cerca de 9% por avós.
O medo é constante na vida da mulher, nenhum local é seguro o bastante nem em casa, trabalho, transporte público, hospitais durante consulta, exame, cirurgia ou até mesmo no parto, a realidade é que nem morto o corpo da mulher está livre de ser violentado, diante de casos de necrofilia.
O fato é que nada justifica ou explica o estupro! Atualmente existem de acordo com o Código Penal Brasileiro, as leis 12.015 de 2009, 13.718 de 2018 e a 12.978 de 2014 que prevêem as diversas vertentes do crime de estupro, tendo penas variadas de acordo com o tipo de crime. Porém, essas leis são apenas o começo da luta que a mulher trava contra a sociedade e com a cultura do estupro.
Caso você suspeite ou testemunhe qualquer situação de violência contra mulheres, seja ela criança, adolescente ou adulta, denuncie pelo disque 100 que é o canal de denúncias do Ministério da Mulher, Família e dos Direitos Humanos, disque 180 que é a Central de Atendimento à Mulher em Situação de Violência ou pelo 190 entrando em contato diretamente com a polícia.
A mulher tem o direito de estar onde ela quiser no horário ou com a roupa que desejar sem sentir medo, sem ter seu corpo violado. Só para lembrar, a minissaia veio bem depois dos primeiros casos de estupros!